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O
QUE É A FOME ?
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FOME
GLOBAL
O
QUE É A FOME ?
A
fome é a escassez de alimentos que, em geral,
afeta uma ampla extensão de um território
e um grande número de pessoas.
A
fome nos tempos atuais tem relação direta
com a "estabilização macroeconômica"
e os programas de "ajustamento estrutural"
impostos pelo FMI e pelo Banco Mundial
aos países em desenvolvimento, portanto, tem
relação direta com as várias
formas de capitalismo que são fomentados nesses
países.
A
fome no mundo
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Cerca de 100 milhões
de pessoas estão sem teto;
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1 bilhão de analfabetos;
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1,1 bilhão de pessoas vivem na pobreza, destas,
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630 milhões são extremamente pobres,
com renda per capta anual bem menor que 275 dólares;
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1,5 bilhão de pessoas sem água potável;
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1 bilhão de pessoas passando fome;
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150 milhões de crianças subnutridas
com menos de 5 anos (uma para cada três no
mundo);
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12,9 milhões de crianças morrem a
cada ano antes dos seus 5 anos de vida;
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No Brasil, os 10% mais ricos detêm quase toda
a renda nacional.
Com
a existência de grandes setores da população
mundial já muito abaixo do limiar da pobreza,
esta subida a curto-prazo dos preços dos produtos
alimentares é devastadora. Há milhões
de pessoas em todo o mundo que se encontram impossibilitadas
de adquirir alimentos para a sua sobrevivência.
Estes aumentos brutais estão a contribuir verdadeiramente
para a "eliminação dos pobres"
através da "morte pela fome". Nas palavras
de Henry Kissinger: "Quem controla o petróleo,
controla as nações; quem controla os alimentos,
controla as pessoas". A "estabilização
macroeconômica" e os programas de ajustamento
estrutural impostos pelo FMI e pelo Banco Mundial aos
países em desenvolvimento (como condição
para a renegociação da sua dívida
externa) conduziram ao empobrecimento de centenas de
milhões de pessoas. As cruéis realidades
econômicas e sociais subjacentes à intervenção
do FMI são a subida dos preços dos alimentos,
as fomes a nível local, os despedi mentos maciços
de trabalhadores urbanos e domésticos e a destruição
de programas sociais. O poder de compra interna caiu,
foram fechadas escolas e clínicas de cuidados
de saúde contra a fome, há centenas de
milhões de crianças a quem tem sido negada
o direito à educação básica.
Esta é de longe a crise econômica mais
grave da história moderna. (Michel Chossudovsky,
The Globalization of Poverty, First Edition, 1997)
Michel
Chossudovsky*
15/05/2008
*Michel Chossudovsky, canadense, é Professor
de Economia na Universidade de Otava e Diretor do Centro
para Investigação sobre a Globalização.
É colaborador da Enciclopédia Britânica.
Os seus escritos estão traduzidos em mais de
20 línguas
INTRODUÇÃO
A
fome é a conseqüência do processo
de reestruturação do "mercado livre"
da economia global que tem as suas raízes na
crise de endividamento do início dos anos 80.
Não é um fenômeno recente como é
sugerido em vários artigos dos meios de comunicação
ocidentais. Estes se concentram apenas na oferta e procura
em curto prazo dos produtos agrícolas, e ignoram
as causas estruturais muito mais amplas da fome global.
A
pobreza e a subnutrição crônica
são condições preexistentes. As
recentes subidas dos preços alimentares contribuíram
para exacerbar e agravar a crise alimentar. A subida
dos preços tem flagelado uma população
empobrecida, que quase não tem meios para sobreviver.
Têm
ocorrido motins por causa do pão quase simultaneamente
em todas as principais regiões do mundo:
"Os
preços dos alimentos no Haiti subiram em média
40 por cento em menos de um ano, em que o custo de produtos
como o arroz duplicou… No Bangladesh, [nos finais
de Abril de 2008], cerca de 20 mil trabalhadores têxteis
saíram para a rua a protestar contra a terrível
subida dos preços dos alimentos e a exigir salários
mais altos. O preço do arroz neste país
duplicou em relação ao ano passado, ameaçando
com a fome os trabalhadores, que ganham um salário
mensal de apenas 25 dólares… No Egipto,
os protestos dos trabalhadores contra os preços
dos alimentos abalaram o centro têxtil de Mahalla
al-Kobra, a norte do Cairo, durante dois dias na semana
passada, em que duas pessoas foram mortas a tiro pelas
forças de segurança. Foram presas centenas
de pessoas e o governo enviou polícias à
paisana para as fábricas para obrigar os trabalhadores
a retomar o trabalho. Os preços dos alimentos
no Egipto subiram 40 por cento desde o ano passado…
No princípio deste mês, na Costa do Marfim,
centenas de pessoas manifestaram-se em frente da casa
do presidente Laurent Gbagbo, cantando "temos fome"
e "a vida está cara demais, vocês
estão a matar-nos.
Manifestações,
greves e confrontos semelhantes ocorreram na Bolívia,
no Peru, no México, na Indonésia, nas
Filipinas, no Paquistão, no Uzbequistão,
na Tailândia, no Iémen, na Etiópia,
e em quase toda a Africa subsaariana". (Bill Van
Auken, Amid mounting food crisis, governments fear revolution
of the hungry, Global Research, April 2008)
"A
ELIMINAÇÃO DOS POBRES"
Com
a existência de grandes setores da população
mundial já muito abaixo do limiar da
pobreza, esta subida a curto-prazo dos preços
dos produtos alimentares é devastadora. Há
milhões de pessoas em todo o mundo que se encontram
impossibilitadas de adquirir alimentos para a sua sobrevivência.
Estes
aumentos brutais estão a contribuir verdadeiramente
para a "eliminação dos pobres"
através da "morte pela fome". Nas palavras
de Henry Kissinger: "Quem controla o petróleo,
controla as nações; quem controla os alimentos,
controla as pessoas".
Quanto
a isto, Kissinger já tinha dado a entender no
contexto do Memorando 200 do Estudo de Segurança
Nacional de 1974; "Implications of Worldwide Population
Growth for U.S. Security and Overseas Interests"
(Consequências do Crescimento Mundial da População
para a Segurança dos EUA e seus Interesses Ultramarinos),
que a ocorrência repetida de fomes podia constituir
de facto um instrumento de controlo da população.
Segundo
a FAO, o preço dos cereais aumentou 88 % desde
Março de 2008. O preço do trigo aumentou
181 % num período de três anos. O preço
do arroz aumentou 50% nos últimos três
meses (ver Ian Angus, Food Crisis: " The greatest
demonstration of the historical failure of the capitalist
model", Global Research, April 2008):
"A
qualidade mais popular do arroz da Tailândia vendia-se
a 198 dólares por tonelada há cinco anos
e a 323 dólares por tonelada o ano passado. Em
Abril de 2008, o preço chegou aos 1 000 dólares.
Os aumentos ainda são maiores nos mercados locais
– no Haiti, o preço de mercado dum saco
de arroz de 50 quilos duplicou numa só semana
em finais de Março de 2008. Estes aumentos são
catastróficos para os 2,6 mil milhões
de pessoas em todo o mundo que vivem com menos de 2
dólares por dia e gastam 60 a 80% dos seus rendimentos
na alimentação. Há centenas de
milhões que não têm posses para
comer". (Ibid).
DUAS
DIMENSÕES INTERRELACIONADAS
Há
duas dimensões interrelacionadas para a atual
crise alimentar global, que estão a lançar
milhões de pessoas em todo o mundo na fome e
na privação crônica, uma situação
em que grupos inteiros de populações deixaram
de ter meios para adquirir alimentos.
Em
primeiro lugar, é o processo histórico
a longo prazo de reforma política macroeconômica
e de reestruturação econômica global
que tem contribuído para baixar os padrões
de vida mundiais, tanto nos países em desenvolvimento
como nos países desenvolvidos.
Em
segundo lugar, estas condições históricas
preexistentes de pobreza de massas têm sido exacerbadas
e agravadas pela recente subida nos preços dos
cereais que, nalguns casos, chegaram à duplicação
do preço de retalho dos produtos alimentares.
Estas brutais subidas de preços resultam sobretudo
do comércio especulativo nos produtos alimentares.
A EXPLOSÃO ESPECULATIVA DOS PREÇOS
DOS CEREAIS
Os
meios de comunicação têm enganado
levianamente a opinião pública quanto
às causas destas subidas brutais de preços,
concentrando-se quase exclusivamente nas questões
dos custos de produção, do clima e de
outros factores que resultam numa oferta reduzida e
que podem contribuir para aumentar o preço dos
produtos alimentares. Se bem que esses factores possam
contribuir para tal, têm uma relevância
limitada para explicar os aumentos brutais e dramáticos
nos preços destes produtos.
Os
preços em espiral dos alimentos são sobretudo
conseqüência da manipulação
do mercado. São atribuíveis sobretudo
ao comércio especulativo no mercado. Os preços
dos cereais são inflacionados artificialmente
por operações especulativas em grande
escala nas bolsas mercantis de Nova Iorque e Chicago.
Vale a pena assinalar que, em 2007, assistimos à
fusão do Chicago Board of Trade (CBOT) com o
Chicago Mercantile Exchange (CME), de que resultou a
maior entidade mundial de comércio de produtos
de consumo, incluindo uma ampla gama de instrumentos
especulativos (opções, opções
a prazo, fundos indexados, etc.)
O
comércio especulativo sobre o trigo, o arroz
ou o milho, pode fazer-se na ausência de transações
reais de bens. As instituições que especulam
no mercado dos cereais não têm que estar
obrigatoriamente envolvidas na venda ou na entrega dos
cereais.
As
transações podem utilizar fundos indexados
das mercadorias, ou seja, apostas sobre os movimentos
gerais de subida ou descida dos preços das mercadorias.
Uma "opção de venda" é
uma aposta de que o preço vai descer, uma "opção
de compra" é uma aposta de que o preço
vai subir. Através duma manipulação
concertada, os comerciantes institucionais e as instituições
financeiras fazem o preço subir e depois fazem
as suas apostas num movimento de subida do preço
duma determinada mercadoria.
A
especulação gera a volatilidade do mercado.
Por seu turno, a instabilidade que daí resulta
encoraja uma maior atividade especulativa.
Geram-se
lucros quando os preços sobem. Em contrapartida,
se o especulador está a descoberto no mercado,
ganha dinheiro quando os preços entram em queda.
Esta
recente explosão especulativa nos preços
dos alimentos tem vindo a provocar um processo mundial
de formação de fome a uma escala sem precedentes.
A
FALTA DE MEDIDAS REGULADORAS DESENCADEIA A FOME
Estas
operações especulativas não provocam
a fome deliberadamente.
O
que provoca a fome é a ausência de procedimentos
reguladores em relação ao comércio
especulativo (opções, opções
a prazo, fundos indexados). No atual contexto, o congelamento
do comércio especulativo sobre produtos alimentares,
decidido politicamente, contribuiria imediatamente para
a baixa dos preços dos alimentos.,
Nada
impede que estas transações sejam neutralizadas
e impedidas através de um conjunto de medidas
reguladoras cuidadosamente concebidas.
Mas,
é visível que não é isso
o que o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional
estão a propor.
O
papel do FMI e do Banco Mundial
O
Banco Mundial e o FMI apareceram com um plano de emergência,
para incentivo à agricultura em resposta à
"crise alimentar". No entanto, não
querem saber das causas desta crise.
O
presidente do Banco Mundial, Robert B. Zoellick, descreve
esta iniciativa como um "novo contrato", um
plano de ação "para o desenvolvimento
a longo prazo da produção agrícola",
que consiste, entre outras coisas, na duplicação
dos empréstimos para a agricultura aos agricultores
africanos.
"Temos
que colocar o nosso dinheiro onde está hoje a
nossa boca para que possamos levar comida às
bocas famintas". (Robert Zoellick, diretor do Banco
Mundial, citado pela BBC, 2.Maio.2008)
A
"medicina econômica" do FMI/Banco Mundial
não é uma "solução"
mas é sobretudo a "causa" da fome nos
países em desenvolvimento. Mais empréstimos
do FMI-Banco Mundial para "incentivos à
agricultura" só servirão para aumentar
os níveis de endividamento e exacerbar a pobreza
em vez de a diminuir.
Os
"empréstimos baseados nesta política"
do Banco Mundial são concedidos na condição
de que os países obedeçam à agenda
política neoliberal que, desde o início
dos anos 80, tem vindo a conduzir ao colapso da agricultura
alimentar a nível local.
A
"estabilização macroeconômica"
e os programas de ajustamento estrutural impostos pelo
FMI e pelo Banco Mundial aos países em desenvolvimento
(como condição para a renegociação
da sua dívida externa) conduziram ao empobrecimento
de centenas de milhões de pessoas.
As
cruéis realidades econômicas e sociais
subjacentes à intervenção do FMI
são a subida dos preços dos alimentos,
as fomes a nível local, os despedimentos maciços
de trabalhadores urbanos e domésticos e a destruição
de programas sociais. O poder de compra interno caiu,
foram fechadas escolas e clínicas de cuidados
de saúde contra a fome, há centenas de
milhões de crianças a quem tem sido negado
o direito à educação básica.
TRATAMENTO
DE CHOQUE DO FMI
Historicamente,
os preços em espiral dos alimentos a nível
retalhista foram sempre provocados pelas desvalorizações
da moeda, que resultaram invariavelmente numa situação
hiper inflacionária. No Peru em Agosto de 1990,
por exemplo, por ordem do FMI, os preços dos
combustíveis aumentaram 30 vezes de um dia para
o outro. O preço do pão aumentou 12 vezes
de um dia para o outro:
"Em
todo o Terceiro Mundo, a situação é
de desespero social e de desânimo social numa
população empobrecida pelos jogos das
leis do mercado. Em 1989, os motins anti-SAP [Programa
de Ajustamento Estrutural] e os levantamentos populares
são reprimidos brutalmente: em Caracas, o presidente
Carlos Andres Perez, depois de ter denunciado retoricamente
o FMI por praticar 'um totalitarismo econômico
que mata não apenas com balas mas pela fome',
declara o estado de emergência e envia unidades
regulares de infantaria e de fuzileiros para as áreas
pobres ( barrios de ranchos) nas colinas circundantes
da capital. Os motins em Caracas anti-FMI foram ateados
por um aumento de 200 por cento no preço do pão.
Foram alvejados indiscriminadamente homens, mulheres
e crianças: 'Noticiou-se que a morgue de Caracas
tinha mais de 200 corpos de pessoas mortas nos três
primeiros dias… e esta avisou que estava a ficar
sem caixões'. Não oficialmente foram mortas
mais de mil pessoas. Tunis, Janeiro de 1984, os motins
pelo pão foram instigados sobretudo pela juventude
desempregada protestando contra o aumento dos produtos
alimentares; Nigéria, 1989: os motins estudantis
anti-SAP levaram ao encerramento de seis universidades
do país pelo Conselho Governamental das Forças
Armadas; Marrocos, 1990: uma greve geral e um levantamento
popular contra as reformas do governo, patrocinadas
pelo FMI". (Michel Chossudovsky, op cit.)
A DESREGULAMENTAÇÃO
DOS MERCADOS DE CEREAIS
A
partir dos anos 80, os mercados de cereais foram isentos
de regulamentação sob a supervisão
do Banco Mundial, e os excedentes de cereais dos Estados
Unidos e da União Europeia (EUA/UE) são
utilizados sistematicamente para destruir os agricultores
e desestabilizar a agricultura alimentar nacional. Os
empréstimos do Banco Mundial exigem o levantamento
das barreiras comerciais sobre os produtos agrícolas
importados, levando ao abaixamento de preços
dos excedentes de cereais dos EUA/UE nos mercados locais.
Estas e outras medidas atiraram os produtores agrícolas
locais para a falência.
O
"mercado livre" dos cereais – imposto
pelo FMI e pelo Banco Mundial – destrói
a economia dos agricultores e põe em risco a
"segurança alimentar". O Malawi e o
Zimbabué já foram países prósperos
com excedentes de cereais. O Ruanda era praticamente
auto-suficiente quanto a alimentos até 1990,
quando o FMI ordenou a introdução dos
excedentes de cereais dos EUA e da UE a preços
baixos no mercado interno, provocando a falência
dos pequenos agricultores. Em 1991- 92, a fome atingiu
o Quénia, a economia do pão com maior
êxito da Africa oriental. O governo de Nairobi
fora colocado na lista negra por não obedecer
às prescrições do FMI. A ausência
de regulamentação do mercado dos cereais
tinha sido exigida como uma das condições
para a reforma da dívida externa de Nairobi com
o Clube de Paris de credores autorizados. (Michel Chossudovsky,
The Globalization of Poverty and the New World Order,
Second Edition, Montreal 2003)
Por
toda a Africa, assim como no sudeste asiático
e na América Latina, o padrão do "ajustamento
sectorial" na agricultura sob a custódia
das instituições do Bretton Woods tem
sido inequivocamente no sentido da destruição
da segurança alimentar. Tem-se reforçado
a dependência vis-à-vis o mercado mundial,
o que conduz a uma explosão nas importações
comerciais de cereais assim como à subida no
influxo da "ajuda alimentar".
Os
produtores agrícolas foram encorajados a abandonar
as culturas alimentares e a virarem-se para culturas
de exportação de "alto valor",
quase sempre em detrimento da auto-suficiência
alimentar. Os produtos de alto valor assim como as culturas
para ganhar dinheiro com a exportação
foram apoiados por empréstimos do Banco Mundial.
As
fomes na era da globalização são
o resultado desta política. A fome não
é conseqüência da falta de alimentos,
muito pelo contrário: os excedentes globais de
alimentos são utilizados para desestabilizar
a produção agrícola nos países
em desenvolvimento.
Fortemente
regulamentada e controlada pelas indústrias agrícolas
internacionais, esta sobre-produção acaba
por conduzir à estagnação tanto
da produção como do consumo dos produtos
alimentares essenciais e ao empobrecimento dos agricultores
em todo o mundo. Além disso, na era da globalização,
o programa de ajustamento estrutural do FMI-Banco Mundial
tem uma relação direta com a formação
do processo da fome porque corrói sistematicamente
todas as áreas da atividade econômica,
quer urbana quer rural, que não sirvam diretamente
os interesses do sistema do mercado global.
Os
rendimentos dos agricultores, tanto nos países
ricos como nos países pobres, são espremidos
por um punhado de empresas globais agro-industriais
que controlam simultaneamente os mercados de cereais,
os abastecimentos agrícolas, as sementes e os
alimentos processados. É uma firma gigantesca,
a Cargill Inc., com mais de 140 filiais e subsidiárias
em todo o mundo, que controla grande parte do comércio
internacional de cereais. A partir dos anos 50, a Cargill
tornou-se o principal fornecedor da "ajuda alimentar"
americana financiada pela Lei Pública 480 (1954).
A
agricultura mundial tem, pela primeira vez na história,
a capacidade de satisfazer as necessidades alimentares
de todo o planeta; no entanto, a própria natureza
do sistema de mercado global impede que isso aconteça.
A capacidade de produzir alimentos é enorme,
mas os níveis do consumo de alimentos mantêm-se
extraordinariamente baixos porque uma enorme porção
da população mundial vive em condições
de pobreza e de privação extremas. Além
disso, o processo de "modernização"
da agricultura levou à espoliação
dos agricultores, aumentou a falta de terras disponíveis
e a degradação ambiental. Por outras palavras,
as próprias forças que encorajam a expansão
da produção global de alimentos estão
também a provocar contraditoriamente uma contração
nos padrões de vida e o declínio na procura
de alimentos.
SEMENTES
GENETICAMENTE MODIFICADAS
Coincidindo
com a instituição da Organização
Mundial do Comércio (OMC) em 1995, ocorreu outra
importante mudança histórica na estrutura
da agricultura global.
Ao
abrigo dos artigos do acordo da Organização
Mundial do Comércio (OMC), os gigantes alimentares
têm uma liberdade sem restrições
para entrar nos mercados de sementes dos países
em desenvolvimento. A aquisição de "direitos
de propriedade intelectual" exclusivos sobre variedades
de plantas pelos interesses agro-industriais internacionais,
também favorece a destruição da
biodiversidade.
Agindo
em benefício de um punhado de conglomerados da
biotecnologia, as sementes geneticamente modificadas
(GMO) têm vindo a ser impostas aos agricultores,
frequentemente no contexto de "programas de ajuda
alimentar". Na Etiópia, por exemplo, na
seqüência de uma grande seca, foram entregues
conjuntos de sementes GMO a agricultores empobrecidos,
com vista à reabilitação da produção
agrícola. As sementes GMO foram plantadas, permitindo
uma boa colheita. Mas depois os agricultores vieram
a saber que as sementes não podiam voltar a ser
plantadas, sem o pagamento de royalties à Monsanto,
ao Arch Daniel Midland e a outros. A seguir, os agricultores
descobriram que as sementes só dariam uma boa
colheita se usassem os produtos adequados, incluindo
o fertilizante, o insecticida e o herbicida, produzidos
e distribuídos pelas companhias agro-industriais
de biotecnologia. Economias rurais inteiras ficaram
presas nas garras dos conglomerados agro-industriais.
A QUEBRA DO
CICLO AGRÍCOLA
Com o alastramento da
adopção de sementes GMO, ocorreu uma importante
mudança na estrutura e na história da
agricultura tradicional desde a sua origem há
10 000 anos.
A reprodução
de sementes a nível da aldeia em viveiros locais
foi interrompida pelo uso de sementes geneticamente
modificadas. O ciclo agrícola, que possibilita
aos agricultores armazenar as suas sementes orgânicas
e a plantá-las para conseguir as suas colheitas
seguintes, foi interrompido. Este padrão destrutivo
– que resulta invariavelmente na fome –
é repetido país atrás de país
levando à morte mundial da economia rural.
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